julho 01, 2008

Gelado de Cerveja

Ao início de uma especiosa tarde de Estio, numa refulgente e inoxidável gelataria, assisti a uma história de bêbedos mais interessante que qualquer das que protagonizei. Temporariamente transladado em Quarteira, essa Torremolinos formato porta-chaves ou Santo António dos Cavaleiros enxertada no cavalo do litoral algarvio, vivenciei a seguinte ocorrência: um esbranquiçado senhor aproximou-se do balcão da gelataria e pediu um gelado. Até aí, nada de particularmente fora de norma. Se solicitasse um cone de pomada para as hemorróidas, seria bizarro. Olhando para o âmbito da oferta, a criatura apresentou dificuldades de decisão (pensava eu). A funcionária indagou o sabor seleccionado pelo venerável ancião. Este, sustentado exclusivamente pelo balcão, retrucou: "-Pode ser de qualquer coisa. Não tem de cerveja?" A educada menina alegou que não dispunha de tal paladar, ao que o distinto e toldado senhor retorquiu: "-Então pode ser de qualquer sabor!" Tornou-se óbvio que nos encontrávamos atolados nesse ténis de perguntas e respostas raquetadas entre ambos. Após alguns minutos, o senhor exprime que o gelado se destina a oferta, o que maravilhou os presentes. Com quarenta graus, transportar um gelado à chapa do astro-rei afigura-se um acto de abnegada temeridade. Após a árdua selecção de um copo com dois sabores, o camarada efectuou um pedido insólito: "-Não dá para embrulhar?" Ao que a gelateira lhe sugere envolver o ditocujo sorvete em guardanapos, actividade rapidamente empreendida pelo cliente. Foi uma verdadeira alegria assistir ao percurso do senhor em direcção ao destinatário do gelado, bolinando em ziguezague numa rua ensolarada e perigosamente direita. Um verdadeira demonstração que valida a Teoria da Relatividade em detrimento da Geometria Euclidiana. Se calhar, o caminho mais curto entre dois pontos num espaço-tempo a quatro dimensões não é uma recta. E tivemos a prova.

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