julho 06, 2009

Chagas de salitre

Olha-me este país a esboroar-se
em chagas de salitre
e os muros, negros, dos fortes
roídos pelo vegetar
da urina e do suor
da carne virgem mandada
cavar glórias e grandeza
do outro lado do mar.

Olha-me a história de um país perdido:
marés vazantes de gente amordaçada,
a ingénua tolerância aproveitada
em carne. Pergunta ao mar,
que é manso e afaga ainda
a mesma velha costa erosinada.

Olha-me as brutas construções quadradas:
embarcadouros, depósitos de gente.
Olha-me os rios renovados de cadáveres,
os rios turvos do espesso deslizar
dos braços e das mães do meu país.

Olha-me as igrejas restauradas
sobre ruínas de propalada fé:
paredes brancas de um urgente brio
escondendo ferros de educar gentio.

Olha-me a noite herdada, nestes olhos
de um povo condenado a amassar-te o pão.
Olha-me amor, atenta podes ver
uma história de pedra a construir-se
sobre uma história morta a esboroar-se
em chagas de salitre.

Ruy Duarte de Carvalho, A Decisão da Idade (Lisboa, Sá da Costa, 1976)

junho 24, 2009

Depois queixam-se da xenofobia

A teologia é tão sólida como a gramática...coitado do Padre António Vieira.

"Iod. O adversário lançou a mão sobre todos os seus tesouros. E ela viu os pagãos penetrarem em seu santuário, aqueles dos quais dissestes que não entrariam em vossa assembleia." Livro das Lamentações, 1:10.

junho 19, 2009

O maior dos diplomatas portugueses actuais


E sim, eu sei que o Durão Barroso será reeleito...e para quando um primeiro-ministro Serra d'Aire? Saíria muito mais barato aos bolsos dos contribuintes...e seria fascinante servir-se granulado nos jantares oficiais de S. Bento. Paralelamente, poderíamos afirmar Portugal como uma democracia muito mais desenvolvida que a americana. Se, recentemente, os americanos (democratas) tiveram que escolher entre um africano e uma mulher, deveria ser dada aos portugueses a possibilidade de escolha entre um Serra d'Aire e um Porco Alentejano. Ou, num futuro próximo, entre uma abetarda e um lince da Malcata...

junho 06, 2009

Hino de Duran


(Mãos de
Edmundo Pedro, fotografadas por José Goulão)


Se tu falas muitas palavras sutis
E gosta de senhas sussurros ardís
A lei tem ouvidos pra te delatar
Nas pedras do seu próprio lar

Se trazes no rosto a contravenção
Muambas, baganas e nem um tostão
A lei te vigia, bandido infeliz
Com seus olhos de raios X

Se vives nas sombras frequentas porões
Se tramas assaltos ou revoluções
A lei te procura amanhã de manhã
Com seu faro de doberman

Se pensas que burlas as normas penais
Insuflas agitas e gritas demais
A lei logo vai de abraçar infrator
com seus braços de estivador

(Chico Buarque, Ópera do Malandro, Rio de Janeiro: 1978).