julho 30, 2008

Soneto III

A certa moça, chamando velho ao autor, que ainda se não tinha por tal

Não te escondo a guedelha encanecida,
Nem da rugosa fronte a cor já baça;
Conheço que o meu lustre, a minha graça
Foi por duros Janeiros destruída:

Confesso, ainda que é iá bem conhecida,
Que a idade minha dos cinquenta passa;
Mas juro que ainda tenho grossa maça,
Qual teso mastaréu a pino erguida:

Se és hidrópica mestra fodedora,
Daquelas que procuram com trabalho
Lanzuda porra, porra aterradora:

Minhas cãs não te sirvam de espantalho;
Põe à prova o teu cono, e sem demora
Verás então se é velho o meu caralho.

António Lobo de Carvalho (Poesias joviaes e satyricas: colligidas e pela primeira vez impressas, Cadix, 1852)

julho 25, 2008

Carruagem 22, Lugar 82

Viajar de transportes públicos comporta dois aspectos essenciais: masoquismo e paciência. Todavia, é nos transportes que se desenrolam as situações mais surreais neste torrão a que chamaram Portugal. Encontram-se obviamente excluídas desta afirmação a Assembleia da República e as Assembleias Gerais do Sport Lisboa e Benfica. Seria estúpido não referir esse ritual de socialização (a la Erving Goffman de Interaction ritual: Essays on face–to–face behavior, Anchor Books, 1967) neste espaço que se espera de pura instrução à populaça ignara (como os escritos da forja de Vasco Pulido Valente, autor a quem muito prezamos, apesar da brandura de sua escrita). O autor entra na carruagem e repara que lhe reservaram um lugar no espaço destinado a quatro pessoas (duas a duas e frente-a-frente). Nos três restantes assentos encontrava-se um grupo muito particular. O homem de meia-idade envergava uma camisa aos quadrados e apresentou uma tatuagem a tinta de esferográfica, possivelmente realizada numa das suas estadias em Angola, onde se entreteve a massacrar pretos. A velhinha, obviamente senil, passou todo o trajecto a suspeitar que havia sido esportulada pela funcionária do lar em que se encontrava (e, a nosso ver, muito bem) depositada, visto ter pago 75 euros no cabeleireiro para obter um look similar a uma lontra com permanente. A mulher de meia idade, companheira do senhor que bebericava uma lata de Sagres no comboio (às 9:30 da manhã, claro está) era uma personagem "esculpida em toucinho", expressão carinhosamente gamada a Fialho d'Almeida (Pasquinadas: jornal dum vagabundo, Civilização, 1890). Quando o autor se aproximou, denotou um fedor fétido no grupo, que logo atribuiu à velhinha. Claramente, a senhora estava morta e decomposta e ninguém a avisara previamente do facto. Que falta de chá, esquecer-se de notificar uma pessoa da própria morte. Resumindo, um verdadeiro calvário de três horas e sem promessa de ressurreição. Um momento ficará para sempre retido na memória do escriba destas linhas: o homem perguntou à velhinha se tinha trazido e a velhinha respondeu afirmativamente. Depois, a velhinha sacou da carteira (e friso as palavras "velhinha" e "carteira") dois DVD's pornográficos feitos em Portugal. Ainda embrulhados no celofane primordial, espécie de hímen na sociedade contemporânea, aura de pureza mesmo quando, claramente, nenhum dos intervenientes no filme era virgem. Ao assistir a essa cena, a mulher de meia-idade, ruge das profundezas de pregas nos foles do seu acordeão carnal a expressão: "-Mas que tara!". Aparte do semblante carregado de orgulho do cavalheiro, notoriamente cinéfilo e apreciador de espectáculos de elevado gabarito, as reacções foram parcas. É pena, pois alguns cientistas estariam concerteza interessados em estudar as práticas reprodutivas do casal de meia-idade. Qualquer coisa entre um tsunami de banha abatendo-se gelatinosamente sobre um fuinha subnutrido. É por essas e por outras que o autor defende a obrigatoriedade da lipossucção em certos casos, desde que o remanescente não seja enviado para uma fábrica de torresmos.

julho 23, 2008

Ser Macho

Nesta recôndita localidade onde os autores sobrevivem, subsiste uma ideia generalizada entre uma grande parte da população local masculina, a ideia que esta mesma localidade se situa no Ribatejo. Não adiantando pormenores, até porque os autores prezam muito a sua condição física e o seu bem-estar, podemos afiançar que tal não é verdade, sendo que a única característica em comum será a que serve de base a este textículo. Essa característica é a veia tauromática inflamada que tais personagens exibem com orgulho, seja em pequenas associações fechadas, quais gentlemen clubs de antanho, seja na forma quase pornográfica com que assistem a corridas de toiros na telvisão ou na forma quase religiosa em que organizam pequenas excursões para assistir às ditas corridas in loco.

Ressalvamos, desde já, que não queremos condenar a prática da tourada. Não o considerando um desporto saudável, também não temos nada contra o facto de, nesta singular manifestação cultural, haver uma besta de 500 kilos armada com um par de cornos que leve com 2 ou 3 estocadas no lombo. É do conhecimento dos autores que existem por aí alguns exemplos taurinos, talvez com menos kilogramas de peso e com maior diâmetro de cornadura, que também as mereceriam. Também não somos hipócritas ao ponto de defender os "direitos" dos "animais".
Como diria o Grande Lebowski: "What's this bullshit? I don't fuckin' care!"

Serve isto para dizer que, aquando de mais uma procissão às Capelas Etílicas cá do burgo, a televisão mostrava uma qualquer corrida de touros. Fomos prontamente avisados que "-Assim é que se vê que os cabrões do Norte é que mandam nesta merda toda, até nos touros".
Pensavam que era só no futebol? Tomem lá, Valentim Loureiro e Papa!!

(Pelos vistos, os defensores dos "animais" tinham interposto uma qualquer bem sucedida medida legal de forma a evitar a transmissão televisiva das corridas da RTP Lisboa e RTP qualquer-coisa-abaixo-do-Douro, tendo esbarrado nos tentáculos taurinos da RTP Norte! Olé!)


E assim sendo, os machos da terra viram desfilar, desde a cornetada inicial, uma série de senhores vestidos com calças justinhas e casaquinhos com muitos debroados e folhinhos e botinha de cabedal, que espetam ... É impressão minha ou isto parece-se demasiado com um qualquer fetiche homo-sado-zoo-masoquista?
Pior: Os verdadeiros machos da tourada, os forcados, (calcinhas justas, coletezinho e ui, o barretezinho) que, supostamente, encaram o bicho mano-a-touro, têm uma personagem de destaque que é o rabejador... Enough said.
E no meio disto tudo, surge Sónia Matias. Um raio de luz e de líbido no meio de tanta paneleirice. O momento de frisson e desconforto entre os velhos "aficionados" foi provocado por um dos jovens taberneiros, novo nestas lides e ainda não ultrapassando todas as fases da tertúlia taurmáquica secreta e que, ao ver a jovem cavaleira solta um sonoro : "TEM É UMA BOA BOCA PRÓ BROCHE". Desconhecendo a apetência oral da menina para a joalharia, aposto que seria concerteza um boa foda. Contudo, apercebi-me que os experimentados da affición não consideraram como séria a hipótese, preferindo dissertar sobre as capacidades de toureio e de matadora da dita cavaleira. A estes senhores, um conselho: Saiam do armário, não esperem pelo Carnaval para se vestirem de mulheres. Abracem-se quando a lide é bem feita e o ferro bem metido. De uma vez por todas, assumam que a tourada é um espectáculo rabeta.

julho 20, 2008

Aveiro

Mais um prospecto turístico ao melhor estilo do Portugal dos Pequenitos. Aveiro, 2006. A Veneza portuguesa, de acordo com a abalizada opinião das mesmas alimárias jornalísticas que compararam a Quinta da Fonte a Beirute. Realmente, um espectáculo diário de rockets nas embaixadas é o equivalente a ciganos bêbedos (e, pelos vistos, vesgos) a disparar caçadeiras. O meu senhorio apresentava-se num imaculado uniforme de gala: boné, bigode, camisa aos quadrados e slips. De destacar que o boné, bigode e camisa aos quadrados parecem constituir os elementos básicos do fardamento de alcoólicos de meia-idade. Quanto aos slips, este autor não se pronuncia, mas presume que seja uma forma de representação de autoridade do género: "-Tenho uma piça tão grande que o melhor é nem usar calças de forma a incutir respeito ao próximo". O simpático senhor cedo desfiou o interminável e entediante rosário respeitante à senhora sua ex: "-Ela está a querer foder-me, não é?" empregando a entoação de um dos malandros lisboetas que servem à mesa nas tascas da Baixa. Jardineiro de profissão, incompatibilizámo-nos aquando da peregrina e brilhante ideia, exclusivamente proveniente daquele sensibilíssimo intelecto, de realizar uma queimada no jardim às seis da manhã de um dia de Julho. O que induz um cabrão do caralho, filho da puta e brochista a incendiar um molho de erva verde (!!!) àquelas matutinas horas? Gostaria de o perceber. E a quantidade de fumarada que a pseudo-fogueira deita? Parecia um concerto dos Grateful Dead no pico da carreira. Após estacionar a gôndola, sentei-me na Praça de S. Marcos a comer gelado, ocupação sobejamente apreciada pela população aveirense. Acerca dos excelentes ovos moles que se servem em Veneza (na Confeitaria Peixinho, passe a viva recomendação para a sua frequência), esgalharei outra croniqueta no mesmo tom desta merda e na altura devida. Realmente, uma esplanada, um bom gelado e um gondoleiro a cantar canções napolitanas tornam Aveiro um dos locais mais aprazíveis deste jardim à beira-mar plantado. Só temos pena de viver no esterco adjacente à área ajardinada.


julho 14, 2008

Abriu a época de caça na Quinta da Fonte

Para quem esteve atento aos frescos eventos de fogo de artifício num bairro periférico da periferia de Lisboa (o que o situa entre o Burkina-Faso e o Burundi), devem ser destacados alguns itens. Em primeiro lugar, que processo leva a que duas minorias étnicas, as quais os media insistem em apontar como naturalmente propensas à criminalidade (contrariando a opinião abalizada de Michel de Montaigne, erroneamente atribuída a Jean-Jacques Rousseau no que toca ao "bom selvagem"), em especial à criminalidade violenta, falhem tantos tiros? Se o leitor reparar com atenção, pode entrever o total desperdício de munições ao longo do filme. Pior, como é que grupos étnicos que treinam numa carreira de tiro desde a vida intra-uterina (informação corroborada por alguns prestigiados órgãos de comunicação social) disparam uma quantidade tão elevada de chumbadas às paredes? É a total descredibilização do mito urbano que associa a coloração da tez à facilidade em manusear armas de fogo. Mais grave, as movimentações das várias equipas tácticas no teatro de operações revelaram um amadorismo proverbial, assemelhando-se a um agrupamento de vizinhos desavindos entendendo-se reciprocamente ao zagalote. Não admira que os portugueses sejam dos povos menos qualificados da Europa. Para suportar esse triste facto bastou assistir ao incompreensível espectáculo emitido a partir da Quinta da Fonte. "Much ado about nothing" diria Shakespeare. Um verdadeiro evento de pirotecnia inofensiva do qual resultaram apenas nove feridos. O ratio tiros disparados/vítimas efectivas foi mais baixo que o índice de produtividade da função pública numa manhã de Segunda-Feira. É revoltante falar de qualificação num país no qual, do universo total de homicídios, apenas uma tangencial franja se refere a homicídios qualificados. Contudo, o actual escriba deposita as maiores esperanças no programa Novas Oportunidades. Talvez estimule a pontaria dos pretos e ciganos de forma a que, da próxima vez que se tornem notícia, seja por uma precisão de criar inveja aos snipers do Marine Corps. One shot, one kill. Mas que isso se desenrole no bairro "deles"...


Porto de Leixões

Diariamente, ronda pelas imediações do Porto de Leixões uma personalidade insigne. Talvez pescador retirado, passeia a camisa aos quadrados e o boné náutico pela cidade, por vezes interrompendo o percurso apenas para atestar o depósito com combustível de alta octanagem. De reconhecimento imediato pelo andar serpenteado e pelo nariz vermelho, deambula pelas ruas sem rota definida. Contudo, há momentos em que o seu rosto se ilumina e os olhos embaciados pelos vapores do álcool reluzem. Um pouco como quando se acena um Big Mac a uma romena faminta a troco de uma valente brochada. (Serve este parêntesis para o autor descartar a responsabilidade em qualquer acto desse soez intento. Não foi um Big Mac, mas sim um Double Cheesburger, passe a publicidade ao fabricante, e não era romena, mas sim moldava, como esta veio a posteriormente explicar enquanto gargarejava com Tantum Verde - este texto deveria ser subsidiado graças a um sábio product placement. As confusões que uma pessoa faz em relação à fast food!) Quando algum transeunte distraído a carregar uma guitarra às costas se cruza com o etilizado druida, este atira de imediato: "-Bob Dylan!" ou, em dias bons, "-Jimi Hendrix!". Contudo, a entoação aponta para uma sincera veneração por esses músicos. Em outras ocasiões, aborda-os com um discurso motivacional, ao melhor estilo Eusébio ("-vontade de querer!"), mas sem tremoços, esses crustáceos fugidios que teimam em escapulir-se se uma pessoa aperta demais. No fundo, são como a ejaculação. O Panoramix, cheio da poção mágica, movimenta-se encarnando o papel de dono do passeio e com tal jactância que me infunde grande respeito. Semanalmente, reflicto no interesse em traçar uma história do indivíduo. Um perfeito alcoólico, crescido nas décadas de 60 e 70 e cujo perfil aponta para alguém que deve ter calcorreado meio mundo antes, durante e depois de decidir navegar dentro de uma garrafa de cerveja, para não mais sair. Nem com GPS. Este é, definitivamente, um exemplo a reter sobre os malefícios da pesca.

julho 12, 2008

Homesick Truckie in the Algarve Dreams of Bacon

The sun bares its golden chest,
makes the palm trees flirt and sizzle.
Green sap simmers, resin fizzes
and he dreams of bacon.

Days basting on the silver sands
and he’s transformed, his lardy pallor
turns from raw prawn to copper god,
his eyes shine with the sweetness
of mangoes, sienna skinned women
wink with their hips, click castanet lips
and he dreams of bacon.

The sunsets are the colour of Sangria.
The petrol demons leave his lungs,
he breathes tangy ocean air,
feels the brine scour his veins
and he dreams of bacon.

He dreams of bacon;
squidged between white bread
so soft and moist it holds
his fingerprints like a plaster cast,
bacon, drenched in a pornography
of lewd ketchup and yellow fat.

He dreams of eating
crispy, streaky bacon butties
in Anne’s Motorway Café
as he watches the juggernauts
waddle by and fade into
a grim backlash of sour British rain.

Gaia Holmes (Dr James Graham’s Celestial Bed, Comma Press, 2006)

julho 11, 2008

Afinal, os autores são mais saudáveis do que eles próprios imaginavam

Quando os autores estimavam ser este um dos piores blogues de todos os tempos, encontraram isto. Se, na declaração inicial de intenções, os correntes dactilógrafos frisaram veementemente que nunca tinham lambido tampões previamente utilizados, o responsável pelo supracitado blog redigiu o seguinte soneto:

"Chupando absorvente íntimo usado

Revirando a lixeira do banheiro
Com critério e com máximo cuidado,
Eu encontro papéis por todo lado,
Todos sujos de bosta por inteiro.

E eu encontro também, muito altaneiro,
A gostosa surpresa de bom grado:
Um absorvente todo ensangüentado
Que eu coloco na boca, bem ligeiro.

O absorvente que estava na vagina
De alguma formosíssima menina
É gostoso e me faz enlouquecer.

Todo o sangue do mênstruo feminino
Eu engulo com sede de menino:
Todo absorvente eu chupo com prazer."

Já agora, se os dilectos leitores quiserem aceder às maiores bases de dados pessoais da Internet, este será um bom ponto de partida.

julho 09, 2008

Mon beau membre asinin

Tes mains introduiront mon beau membre asinin
Dans le sacré bordel ouvert entre tes cuisses
Et je veux l’avouer en dépit d’Avinain
Que me fait ton amour pourvu que tu jouisses

Ma bouche à tes seins blancs comme des petits suisses
Fera l’honneur abject des suçons sans venin
De ma mentule mâle en ton con féminin
Le sperme tombera comme l’or dans les sluices

O ma tendre putain tes fesse ont vaincu
De tous les fruits pulpeux le savoureux mystère
L’humble rotondité sans sexe de la terre

La lune chaque mois si vaine de son cul
Et de tes yeux jaillit quand tu les voiles
Cette obscure clarté qui tombe des étoiles

Guillaume Apollinaire (Les Onze mille verges ou les Amours d'un Hospodar, Paris: Gaucher, 1907)

Para bom entendedor, meia palavra basta

A presente curtíssima metragem apresenta a reacção de uma idosa senhora ao trailer do mediatizado filme Hungry Bitches (realizado pelo prestigiado Marco Villanova). Os fotogramas em questão fundem-se numa cena em que duas mulheres interagem mutuamente, em especial a partir do momento em que uma das jovens defeca abundante e consistentemente para uma taça de gelado. Depois, ambas se deliciam com o recém-nascido petisco (dado à luz pelo orifício convizinho ao entrefolhos feminino), ao qual é posteriormente adicionado vómito. Na sinopse, as fezes e o vómito encontram-se eufemizados pela expressão "warm meal", remetendo para uma espécie de menu de degustação fecal, tão na moda em determinados círculos (com particular destaque para a febre "gourmet" que assombra a cretina classe média autóctone). A partilha do cagalhão é apresentada como um gesto de amor verdadeiro, que instila a mais seráfica ternura ao espectador. Neste caso, a locução "vai comer merda" adquire um significado muito particular. Olhando bem para a coisa, imagine o caro leitor quantas refeições seria possível realizar com uma única ingestão de alimento. Um verdadeiro incentivo à poupança, tal como a senhora que era tão poupadinha, tão poupadinha, tão poupadinha, que guardava o período para confeccionar arroz de cabidela. Noutro nível de leitura, a avozinha defende que o neto deveria "falar com alguém"...Os autores também, conquanto não seja com eles.

julho 08, 2008

Lista de Casamento

Este reconto encontra habitáculo numa terreola que se tem afirmado enquanto genuíno burrié no nariz do globo terrestre. Duas mulheres, claramente mãe e filha, entraram numa loja conhecida pelos seus mamarrachos de distintíssimo requinte, ao gosto das mais prestigiadas leitoras da Nova Gente pululantes em todo o Portugal rural. Interrogam a funcionária sobre a possibilidade de encetar uma lista de casamento nesse estabelecimento. À resposta afirmativa, explicam que se destina à irmã da adolescente presente, que se iria unir pelos nós de correr do santo matrimónio. Transcorridos alguns minutos na selecção de itens a integrar a lista, a funcionária (criaturinha obcecada pela respeitabilidade, dado que a remete, infalivelmente, para os estratos populacionais cuja dimensão dos sonhos se apresenta na razão inversa ao rendimento e ao QI) atirou a seguinte pergunta à jovem fêmea: "-E tu, não gostavas de te casar?". Pausa longa. A rapariga transmuta-se nesse momento, como se um espírito malino a possuísse ou as línguas de fogo pentecostais se apropriassem do aparelho fonador. "Et apparuerunt illis dispertitae linguae tamquam ignis, seditque supra singulos eorum; et repleti sunt omnes Spiritu Sancto et coeperunt loqui aliis linguis, prout Spiritus dabat eloqui illis." (Actus Apostolorum, 2: 3-4). Alterando a tessitura vocal, a núbil adolescente replica, de forma a enfatizar a sua candura: "-Eu quero é pichota! Eu quero é foder!". Seguiu-se um momento de silêncio, em que o êxtase contemplativo da funcionária se fixou e substanciou nas suas fuças muares. Todo o universo pequeno-burguês se desmoronou num ápice, como se as trombetas de Josué soassem às muralhas de Jericó. A rapariga expôs o interesse em ser penetrada nas entranhas repetida e ferozmente, como se a sua cona fosse o túnel do Rossio. É caso para dizer que nem um valente carregamento de Lauroderme (passe a referência publicitária) reduziria os efeitos da assadura resultante de tão arreigado desejo. Pelos vistos, a inocente adolescente queria ser mais montada que os póneis da Feira Popular. Por favor, não matem os sonhos da juventude! 


julho 06, 2008

Orgassema

de semântica sêmea
se insinua o sêmen
na lacona lagoa lacunar
e da sádica sede se ressente
o sentido
no sentido cunar.

se sádica ou sábia
quem o saberá?
Se salubre salgado
o teu sabor a odre
é a onda do útero
é terra que remorde
a espera de esperma
nas ásperas paredes.

e o significado vem
da fricção rítmica e formal
entre as mucosas rubras
do pênis, da vulva, da boca 
ou da anal.

(Ernesto Geraldes de Mello e Castro, Cara lh amas: poemas eróticos e sarcásticos, Afrodite, 1975)

julho 04, 2008

Sonetos

De forma a destemperar este espaço da recente primazia atribuída a textos em língua inglesa, os autores afixam um exemplo de ouro-de-lei na escrita portuguesa:

Tanto de meu estado me acho incerto, 
Que em vivo ardor tremendo estou de frio; 
Sem causa, juntamente choro e rio, 
O mundo todo abarco, e nada aperto.

É tudo quanto sinto um desconcerto: 
Da alma um fogo me sai, da vista um rio; 
Agora espero, agora desconfio; 
Agora desvario, agora acerto.

Estando em terra, chego ao Céu voando; 
Num'hora acho mil anos, e é de jeito 
Que em mil anos não posso achar um'hora.

Se me pergunta alguém porque assi ando, 
Respondo que não sei, porém suspeito 
Que só porque vos vi, minha Senhora.

(RHYTMAS / DE LVIS DE CAMOES, / Diuididas em cinco partes. / Dirigidas ao muito Illustre senhaor D. Gonçalo Coutinho. / [desenho] / Impressas com licença do supremo Conselho da geral / Inquisição, & Ordinario. / EM LISBOA, / Por Manoel de Lyra, Anno de M.D.Lxxxxv. / a custa de Esteuão Lopez mercador de libros.»)

Saída nocturna

Esta historinha ocorreu numa cidade raiana não identificada, dada a conhecer por Paco Bandeira e pelas ameixas. Um senhor contínuo (actualmente promovido a Auxiliar de Acção Educativa), bastante reconhecido pela sua polidez e temperança, decidiu sair para a noite. A modorra e o tédio colavam-se-lhe ao corpo e espírito como película aderente. Encharcou-se em Old Spice e dirigiu a sua Zundapp para a cidadela-fortaleza. Entrado no dédalo urbano, inicia a busca de um passatempo nocturno. Absolutamente desprevenido, encontra uma peregrina da calçada, no seu vaivém pelo passeio. Entabula uma conversa casual e desinteressada, onde expõe os seus almejos de diversão, contanto que seja na rua, pois não dispõe de um fundo de maneio que lhe permita suportar estadias (mesmo que horárias). Discutiu com ela os serviços e os emolumentos correspondentes, tendo principiado a transacção. A meretiz transitou, à velocidade da queda, de peregrina a pé a peregrina de joelhos, esforçando-se para cumprir o contrato outorgado. Tarefa ingrata, viver de joelhos e com uma pila a tresandar de Old Spice na boca. Ao menos, um Calvin Klein ou Hugo Boss, que sempre demonstram alguma classe, apesar do ardor que causam na glande. Um pormenor quase insignificante maliciosamente ocultado pelo narrador até este ponto, mas do qual depende o desenrolar da acção dramática: a senhora padecia de uma enfermidade designada por epilepsia. No mais imprevenido dos momentos possíveis, iniciou-se o ataque e a doente ferrou com uma enérgica trinca o membro viril do supra-citado contínuo. Tal como certas raças de caninos, a prostituta mordeu e não largou. Este facto serve para ilustrar que, tal como os cães, algumas mulheres deveriam ser incluídas na lista de animais perigosos. O senhor ficou de tal forma agarrado à dentição da propiciadora de um prazer masoquista que urrou e uivou uma quantidade infindável de imprecações. A fornecedora de serviços encontrava-se de tal modo presa à fragância do Old Spice peniano que, no esforço do desabrochar (ou seja, libertar o utente da dentária ratoeira), foi necessário arremessar um rombo calhau da calçada bem na pinha da enferma. Caro leitor, esta narração encontra aqui o seu término. Contudo, presuma que o final não terá sido: e viveram felizes para sempre...

julho 03, 2008

The Muppet Show Theme

[Kermit]
Ladies and Gentlemen, Its The Muppet Show!

[Muppets]
Its time to play the music
Its time to light the lights
Its time to meet the muppets on the Muppet Show tonight.

Its time put on makeupIts time to dress up right
Its time to raise the curtain on the Muppet Show tonight

[Old Men]
Why do we always come here?
I guess we'll never know
Its like a kind of torture
To have to watch the show

[Muppets]
But now its getting started
Why don't you get things started?
Its time to get things started
On the most sensantionalInspirational
Celebrational
Muppet-ational
This is what we call The Muppet Show!

julho 02, 2008

Misterious Ways

A baptist preacher was completing a temperance sermon: with great expression he said:
"If I had all the beer in the world, I'd take it and throw it into the river."

With even greater emphasis, he said:
"And if I had all the wine in the world, I'd take it and throw it into the river."

And then, finally, he said:
"And if I had all the whiskey in the world, I'd take it and throw it into the river."

He sat down.

The song leader then stood very cautiously and announced with a pleasant smile:

"For our closing song, let us sing Hymn #518: "Shall We Gather at the River?". (composed by Robert Lowry, first published: Happy Voices, 1865, n.º 220)


Regime de vivre

I rise at eleven, I dine about two,

I get drunk before seven; and the next thing I do,

I send for my whore, when for fear of a clap,

I spend in her hand, and I spew in her lap.

Then we quarrel and scold, 'till I fall fast asleep,

When the bitch, growing bold, to my pocket does creep;

Then slyly she leaves me, and, to revenge the affront,

At once she bereaves me of money and cunt.

If by chance then I wake, hot-headed and drunk,

What a coil do I make for the loss of my punk!

I storm and I roar, and I fall in a rage,

And missing my whore, I bugger my page.

Then, crop-sick all morning, I rail at my men,

And in bed I lie yawning 'till eleven again.


 John Wilmot, 2nd Earl of Rochester (1647-1680)


julho 01, 2008

Gelado de Cerveja

Ao início de uma especiosa tarde de Estio, numa refulgente e inoxidável gelataria, assisti a uma história de bêbedos mais interessante que qualquer das que protagonizei. Temporariamente transladado em Quarteira, essa Torremolinos formato porta-chaves ou Santo António dos Cavaleiros enxertada no cavalo do litoral algarvio, vivenciei a seguinte ocorrência: um esbranquiçado senhor aproximou-se do balcão da gelataria e pediu um gelado. Até aí, nada de particularmente fora de norma. Se solicitasse um cone de pomada para as hemorróidas, seria bizarro. Olhando para o âmbito da oferta, a criatura apresentou dificuldades de decisão (pensava eu). A funcionária indagou o sabor seleccionado pelo venerável ancião. Este, sustentado exclusivamente pelo balcão, retrucou: "-Pode ser de qualquer coisa. Não tem de cerveja?" A educada menina alegou que não dispunha de tal paladar, ao que o distinto e toldado senhor retorquiu: "-Então pode ser de qualquer sabor!" Tornou-se óbvio que nos encontrávamos atolados nesse ténis de perguntas e respostas raquetadas entre ambos. Após alguns minutos, o senhor exprime que o gelado se destina a oferta, o que maravilhou os presentes. Com quarenta graus, transportar um gelado à chapa do astro-rei afigura-se um acto de abnegada temeridade. Após a árdua selecção de um copo com dois sabores, o camarada efectuou um pedido insólito: "-Não dá para embrulhar?" Ao que a gelateira lhe sugere envolver o ditocujo sorvete em guardanapos, actividade rapidamente empreendida pelo cliente. Foi uma verdadeira alegria assistir ao percurso do senhor em direcção ao destinatário do gelado, bolinando em ziguezague numa rua ensolarada e perigosamente direita. Um verdadeira demonstração que valida a Teoria da Relatividade em detrimento da Geometria Euclidiana. Se calhar, o caminho mais curto entre dois pontos num espaço-tempo a quatro dimensões não é uma recta. E tivemos a prova.