As Caldas da Rainha foram definidas por Luiz Pacheco da seguinte forma: "É uma terra muito bonita que tem um parque muito catita." ou "é a terra onde melhor se caga porque é a terra onde melhor se come." (O caso das criancinhas desaparecidas, Círculo de Leitores, 1981). Para o autor, é uma terreola onde se cruzam diversos aspectos das suas memórias. Obnubiladas pela estratificação sedimentar da passagem do tempo, as rememorações dessa cidade integram-se num processo de reavaliação de um passado inexistente, tal como um mau romancista o empreenderia. Mencionando en passant o jardim, no qual idosos e infantes ocupam parte das sua faina diária de tonturas de barata (e onde se pode remar furiosamente até a exaustão) e as famigeradas cavacas, as Caldas oferecem outros atractivos. Um elemento cultural centrípeto neste localidade é a cerâmica. O leitor ter-se-á automaticamente lembrado de determinados objectos de olaria de configuração fálica. Não será, de todo, a presente abordagem, pois seria demasiado imediato num texto desta natureza. Na década de 80 do século XIX, foi aí fundada a Fábrica de Faianças das Caldas da Rainha, actividade coordenada pelo artista plástico e publicista Rafael Bordalo Pinheiro. Cedo se estabeleceu no panorama nacional pelas suas faianças decorativa e artística. Paralelamente, nas Caldas nasceu José Malhoa, esborratador de telas. Não confundir, por favor, com o malabarista da glote e pai de uma boneca insuflável que lançou o fonograma intitulado Eu vou a todas (Espacial, 2005). Gargantas à parte, a cidade das Caldas dispõe de recentemente reactivadas termas indicadas para o tratamento de variadas maleitas do foro respiratório, reumático e dermatológico. O autor desconhece os tratamentos efectuados, pois o âmbito de actividade das milagrosas águas não abrange doenças venéreas. Paralelamente, germinou uma instituição de ensino superior empenhada em formar e creditar alguns freaks para as diversas áreas da vida artística nacional. Escusado será dizer que o mais valioso contributo que esses agentes poderiam, eventualmente, entregar ao meio cultural autóctone seria a transformação de amálgamas informes de argila em modelos perfeitos da genitália masculina. Com paciência e algum engenho, tornar-se-ia aceitável legitimar a cerâmica fálica como uma alegoria off para o Dasein heideggeriano, em que o Homem desamparado é lançado ao Mundo (Sein und Zeit, 1927). Este texto consistiu numa extensa enumeração de lugares-comuns. Pedimos desculpa a António Vitorino pela usurpação da metodologia que tanto nos encanta nas noites de Segunda-Feira da RTP. À semelhança de certos documentários patrocinados pelo serviço público televisivo (financiado pelo contribuintes e anunciantes), desconhecemos se este périplo turístico pelas localidades lusas irá prosseguir em próximas edições.
junho 03, 2008
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário