junho 01, 2008

Embaraços

Embaraços. Toda a gente os teve. Maiores, menores, frequentes, pontuais. Um aspecto transversal a todos os embaraços é o seu ângulo público. O embaraço só é possível mediante a presença do Outro. "L'enfer, c'est les autres" (Jean-Paul Sartre, Huit clos, Gallimard, 1947). Desse axioma estiveram bem conscientes personalidades como Nuno Guerreiro, aquando da propagação de um arroto monumental de sua autoria através do sistema de som do Coliseu dos Recreios, no preciso momento em que ia agradecer a atribuição da estatueta numa retardada gala dos Globos de Ouro. A próxima edição do Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa incluirá um importante adenda. À definição de embaraço será adicionada a expressão "António Guterres". A transmissão em directo de um momento em que o engenheiro do Técnico e explicador de Matemática revela, a todo o país, o seu virtuosismo no campo do raciocínio numérico ficou tatuada indelevelmente nas memórias de alguns indivíduos maldosos (entre os quais se inclui o autor e, provavelmente, grande parte dos três leitores deste blog). Contudo, todos tropeçamos em embaraços na vida pública quotidiana. Malhamos violentamente num passeio, para gáudio dos espectadores inadvertidos, marramos com a cornadura (ou será corna dura?) num poste ou, pura e simplesmente, mijamo-nos nas calças enquanto esperamos que as nossas respectivas se despachem da Zara. Confesso estar a elaborar um esquema infalível para acompanhar mulheres ao longo dos seus intermináveis e labirínticos safaris pelas lojas, no qual participam rações de combate, dois Lexotan e um saco de fraldas para adultos incontinentes. Aliás, a geração a que pertence o autor concerteza irá sofrer mais e mais precocemente de problemas de próstata graças à proliferação de centros comerciais em território nacional. Obrigado, Eng. Belmiro! Outras situações caricatas podem ocorrer quando a aparelhagem se encontra em estado vegetativo durante um soundcheck até alguém soltar um violento palavrão, que fica a ressoar insidiosamente no éter do terreiro das festividades. Ou quando se faz um piano subito numa conversa de amigos e se ouve uma solitária e maviosa voz a proferir o polido comentário: "- Essa eu já comia!" no preciso momento em que o namorado de "Essa" atravessa a área de segurança do grupo. Escusado será dizer que o macho, inflado à conta de esteróides anabolizantes e de elevações realizadas num ginásio de Ronfe (o qual, de momento, se encontra a competir com o Instituto Gulbenkian de Ciência no campo da Microbiologia, dada a quantidade assinalável de estirpes de fungos e bactérias cultivadas no perímetro dos balneários, autênticas caixas de Petri no que toca à proliferação desses entes microscópicos), demonstra o seu orgulho por "andar a comer uma gaja tão boa". Isto na melhor das hipóteses, pois as coisas poderão azedar e promover a ocorrência de um incidente diplomático de dimensões avassaladoras, concluído pela reconfiguração da estrutura óssea da cara do autor do comentário a partir de métodos artesanais. Dos diversos embaraços possíveis, escolham, por gentileza, os que melhor vos servirem. Se entenderem que a vossa beleza interior poderia beneficiar com uma requalificação em profundidade do trombil, força. Pessoalmente, prefiro apresentar com orgulho as nódoas de urina nas minhas calças e contar histórias divertidas acerca destas, do género: "- Ainda bem que me pergunta sobre isso, estava aqui a falar consigo e, graças ao teor magnífico do seu perlado discurso, embeveci-me a tal ponto que urinei toda a minha farpela."

Algum embaraço denota a actual primeira-dama da República francesa nesta fotografia:


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